A RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO DO CONSUMIDOR E A ADVOCACIA

Postado em 15 dezembro de 2022.

Advogar é uma arte. Aliás, é uma arte defendida pela Constituição Federal, no artigo 133, que deixa claro que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”

Quando se depara com o dia a dia da atividade jurídica dentro dos escritórios de advocacia, tem-se que uma importante frente de trabalho está configurada na responsabilidade civil, cujo conceito, em sua essência, traduz-se na aplicabilidade do artigo 186 do Código Civil, que assim assegura:

“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Ou seja, para que uma pessoa possa ser responsabilizada, civilmente, é imprescindível a presença de três requisitos basilares: Ato ilícito, dano e nexo de causalidade entre ambos.

Na prática jurídica, as ações indenizatórias têm ganhado destaque. Principalmente no âmbito das relações de consumo. Isso porque, os consumidores têm sido mais conscientizados dos seus direitos, e da necessidade de defendê-los.

Para deixar claro, os conceitos de consumidores e fornecedores, de modo geral, estão preconizados nos artigos 2º e 3º e 17º do Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078/90. E, de modo objetivo, o consumidor é toda a pessoa (física ou jurídica) que adquire ou utiliza o produto ou serviço como destinatário final, bem como as eventuais vítimas de um evento ou de uma falha na prestação do serviço. Por sua vez, o fornecedor vem a ser toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como entes despersonalizados, que, de alguma forma, tenham relação, direta ou indireta com a disponibilização do produto e do serviço no mercado de consumo.

Como se sabe, dadas as peculiaridades econômicas e produtivas, é incontroverso que os fornecedores acabam por ter uma superioridade técnica em relação ao consumidor. Isso porque é o detentor dos insumos e precifica o produto e o serviço disponibilizados no mercado.

De tal sorte, os consumidores tornam-se a parte vulnerável da relação contratual. Inclusive, a vulnerabilidade é reconhecida pelo próprio Código de Defesa do Consumidor, como parte da Política Nacional de Relação de Consumo, no artigo 4º I.

Assim, para buscar o equilíbrio da relação contratual, e assegurar aos consumidores a paridade de tratamento processual, considerando o poderio econômico e técnico das empresas, fez-se imprescindível que a legislação protegesse os consumidores, invertendo o ônus probatório em seu favor, o que se deu no artigo 6º, VIII do CDC.

Normalmente, conforme artigo 373, I e II do Código Civil, aquele que alega um fato, tem que prová-lo, e aquele que se defende de um fato que lhe fora imputado, tem que desconstituir, modificar ou extinguir os fatos, mediantes provas apresentadas.

Mas, se a relação contratual for de consumo, essa premissa se inverte, de forma que os fornecedores têm que provar que o ato ilícito não existiu.

Trata-se da efetividade do princípio da igualdade: Tratar os iguais, igualmente, e os desiguais, desigualmente, na medida de suas desigualdades.

Quando um consumidor ingressa em juízo, por exemplo, porque tem o seu nome negativado por dívida já paga, ou por dívida inexistente, tem o direito de postular em juízo pela declaração de inexistência do débito ou do vínculo contratual, e, ainda, de ser indenizado em um montante pecuniário, caso tal fato tenha atingido a sua imagem de bom pagador no mercado de consumo, com a exposição indevida de seu nome.

Com a inversão do ônus probatório em favor dos consumidores, cabe às empresas provarem em juízo a existência da dívida e/ou do vínculo contratual, e o exercício regular do direito de cobrança, sob pena de ter que baixar a negativação, e, ainda, indenizar o consumidor, quando for o caso. Em síntese, deve apresentar o contrato e a fatura que subsidiaram a negativação.

Nesse sentido, a advocacia atual deve adotar uma série de cautelas antes de demandar ou defender em ações declaratórias de inexistência de débito ou de vínculo contratual.

Acaso advoga-se para os consumidores, apesar de ter a inversão do ônus da prova em seu favor, deve-se atentar para o modo de exposição dos fatos em juízo, para evitar ser surpreendido com condenações em litigância de má fé.

Ora, se o cliente, consumidor, efetivamente, não tiver celebrado qualquer contrato com a empresa que o negativou, torna-se VÍTIMA da relação de consumo, nos termos do artigo 17 do CDC, e, portanto, tem o direito de ver o seu nome desvinculado de eventuais negativações da aludida empresa, e, ainda, conforme o caso, ser indenizado.

No mesmo viés, se o consumidor tiver um vínculo contratual com a empresa que o negativou, mas desconhecer o débito que fundamentou a negativação, nos termos dos artigos 2º e 3º do CDC, também tem o direito de ingressar em juízo, ter o seu nome desvinculado da negativação, e, ainda, conforme o caso, ser indenizado.

No entanto, é importante mencionar que a indenização não é automática. A indenização decorrente da negativação indevida, somente tem pertinência se, em razão da negativação, o consumidor tiver seu nome exposto no mercado de consumo, atingindo, diretamente, os créditos que teria direito.

De tal sorte, se a negativação, mesmo que indevida, for lançada quando, na ocasião, o nome do consumidor já estava negativado por outros motivos, não há que se falar em indenização, considerando que não foi o fato primordial para exposição do nome. É, na realidade, a efetividade do nexo causal, elemento da responsabilidade civil.

O nexo causal é o que liga uma ação indevida ao dano. Se, quando da negativação indevida por determinada empresa, o nome do consumidor já estava inserido nos órgãos de restrição ao crédito, significa que não há responsabilidade da empresa Ré, sequer dano propriamente dito.

É o que diz a Súmula nº 385 do STJ: Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.

Nesses casos, o consumidor terá direito à baixa da negativação e à declaração de inexistência do débito cobrado, mas não à indenização.

Sob esses aspectos, quando se advoga para empresas que ocupam o polo passivo da demanda, ou seja, que são Rés, a cautela na elaboração da defesa deve ser ainda maior, sob pena de sofrer com os reflexos da inversão do ônus da prova em favor do consumidor.

Como vimos, nas relações de consumo, a empresa já ingressa no processo com uma responsabilidade maior, posto que, ante a inversão do ônus probatório em favor dos consumidores, é a empresa que tem que comprovar que o vínculo contratual ou o débito existe. E, para isso, deve instruir o processo com o maior número de provas possíveis que lhe assegure o direito de cobrança, a inadimplência do consumidor, e a necessidade de inclusão da negativação nos órgãos de proteção ao crédito.

Em assim o fazendo, as decisões costumam ser desfavoráveis aos consumidores, inclusive condenando-os ao pagamento do débito devido, bem como à multa por litigância de má fé, que, segundo o artigo 81 do Código de Processo Civil, pode variar entre 1% a 10% do valor corrigido da causa.

Portanto, o advogado deve sempre alertar os clientes dos riscos da demanda, sejam eles consumidores ou fornecedores, e deve sempre cobrar que ajam com transparência no processo, juntando absolutamente todas as provas.

Aliás, deve-se sempre lembrar que os advogados expõem os fatos de acordo com o que o cliente lhe apresenta, de modo que os clientes jamais devem omitir informações de seus advogados, sob pena de, como visto, poderem ser condenados em litigância de má fé.

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